sexta-feira, 25 de junho de 2010

Enchentes

Já comentei aqui sobre o medo que eu sentia de terremotos e "macaréus", no entanto, eu só tinha notícias distantes daqueles tipos de catástrofes.
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A primeira catástrofe de que tive notícias e que estava próxima de mim, foi o "arrombamento" do Orós... Também foi em O Cruzeiro que vi as fotos dos desabrigados, do açude arrombado e, eu acho, de casas destruídas...
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Fiquei sabendo que o Orós ficava no sertão... Àquela altura eu já estava meio grandinha e já sabia que o sertão era lugar de seca... Já vira retirantes espalhados pela cidade a pedir esmolas, em 1958... Não sabia que por lá também podia acontecer inundações...
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No ano seguinte, fomos morar em Recife e pude ser, praticamente, vizinha das enchentes... Lembro de ter ido um dia com Francisca e, eu acho, com Felipe, ver o rio (muito mais cheio do que eu costumava ver) passar sob a Ponte do Derbi carregando colchões, cadeiras e outros objetos que trazia das casas de cidades que inundara... Aquele rio sempre fora um vizinho muito lindo (sou apaixonada por ele até hoje!), mas naquela ocasião me pareceu assustador!!
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Lá mesmo em Recife havia regiões que alagavam, mas nós morávamos longe delas...
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Foi em 1970, quando já estudava Engenharia, pude sentir o que era uma enchente recifense... mas não foi "cheia de rio", aquela enchente foi resultante de um temporal muito violento que alagou a cidade em poucas horas...
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Lembro que estava na Faculdade à tarde fazendo aula prática de Física em um laboratório escurecido por cortinas pretas nas janelas fechadas (lembro de um monte de coisas sobre essas aulas práticas de Física... mas não falarei sobre isso agora, senão esqueço meu tema, como costumo fazer...).
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Quando saímos do laboratório, o dia também já estava bastante escuro (lá em Recife o dia escurece muito cedo, como em João Pessoa...) e eu desci rapidamente, para tentar pegar o ônibus que me tiraria da Cidade Universitária para o ponto da Caxangá, em frente ao Barão de Lucena, onde eu pegaria um ônibus para o Centro.
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No pátio em frente à cantina da Escola, no entanto, havia muita gente e muita agitação... O pessoal falava que estávamos ilhados, que a cidade estava alagada (quem não conhece a vida sem o telefone celular e sem a internet sem fio, deve achar estranho falos como os que conto por aqui...) e que não haveria ônibus para nos apanhar ali... Eu fui logo tratando de procurar Felipe, que também deveria estar na Escola àquela hora, mas nenhum dos colegas dele sabiam me dizer onde ele andava...
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Bem, quando o nosso ônibus (o menorzinho dos dois que faziam nosso transporte para a Caxangá) chegou, eu tratei de me enfiar nele de qualquer modo, ali era que eu não passaria a noite! (se não me falha a memória, àquela altura já não havia energia e a escuridão nunca me foi muito atraente, muito menos com uma trilha sonora sob a responsabilidade das rãs daquela várzea...)
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O ônibus seguiu superlotado... depois de um tempo que pareceu enorme, nos deixou (abandonou? Lembro que insistimos muito, em vão, para que o motorista nos levasse até mais adiante, onde achávamos que a situação estaria mais tranquila...) em uma Caxangá cheia d'água... por onde só uns poucos ônibus (os que tinham o escapamento na parte superior) e caminhões trafegavam... Como tenho um anjo-da-guarda muito zeloso, consegui embarcar em um daqueles ônibus apinhados de fugitivos da enchente...
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A viagem até a Conde da Boa Vista, meu destino, foi longa e muito atribulada... Nosso ônibus resgatava todos que pedissem por ajuda... Em uma das paradas, subiu uma mulher que gritava dizendo que havia uma cobra agarrada à perna dela... A mulher foi puxada para dentro do ônibus pelos passageiros que estava perto da porta , que foi fechada rapidamente... não vi nenhuma cobra, se havia uma, ficou por lá... (afortunadamente!)
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Bem, não faço ideia da duração da viagem, mas cheguei ao meu destino depois de muito tempo... Quando desci do ônibus, no entanto, tive que atravessar, não uma rua, mas um rio... Havia água à altura de minha cintura, na Conde da Boa Vista... para atravessar, venci ondas provocadas por "ônibus-lanchas" que "navegavam" por ali...
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Enfim, cheguei ao edifício onde morávamos... Encontrei o porteiro e perguntei logo por Felipe, que ele disse que já chegara e subira (para mim foi um alívio saber que meu irmão estava a salvo)... Claro que o elevador não funcionava... tive que subir as escadas escuras, tateando e morrendo de medo... em medo muito maior que o cansaço de toda aquela aventura...
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Quando cheguei ao nosso apartamento, bati na porta, pois minha chave estava dentro da bolsa (que devia estar ensopada, mas eu não registrei esse detalhe) e tudo ali era muito escuro... Felipe veio atender a porta, de pijama, certo tempo, pois já estava dormindo... Quando lhe perguntei se não estava preocupado comigo, ele foi sincero em responder que não, o que me deixou muito revoltada!!
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Essa foi a única vez em que estive em uma enchente e essa lembrança sempre me vem à mente quando tenho notícia sobre inundações...
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A enchente atual, dos rios de Alagoas e Pernambuco, com certeza é muito mais grave do que a que vivenciei... Mesmo tendo, dois dias depois, ido para João Pessoa e encontrado Goiana alagada, com as casas cobertas de água até os telhados e sem de suas pontes da BR-101 (havia um desvio, devido à queda da ponte, que aumentou minha viagem de duas para seis horas...)... Quando a água baixou, as casas continuavam lá... com suas paredes marcadas indicando a altura que a água do rio atingira... Dessa vez, a fúria dos rios derrubou as casas... Uma coisa muito triste!!



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